Quando o pai foi transferido para a Estação Tupintuba, na linha São Luiz Gonzaga – Santiago, Seu Paulo pode entrar na escola ferroviária e concluir seus estudos primários. Foi nesse mesmo local que, no final da década de 40, Seu Paulo começou a acompanhar o pai na estação, vendendo bolos e biscoitos confeitados por sua mãe aos passageiros que por lá circulavam. Foram dias de muita aventura entre os tantos trens, indo e vindo, transportando pessoas das mais diferentes localidades.
Em 1953 foi transferido para a Estação Pedreira, em Santa Maria. Foi então que, aos dezessete anos, Seu Paulo entrou para o Departamento de Obras Novas da Viação Férrea do Rio Grande do Sul como ajudante de carpinteiro. Em 1954, Seu Paulo foi transferido para Arroio do Só, onde exerceu q atividade de Guarda Freio. Logo depois, em 1956, passaria a ser Praticante de Telegrafista – ou como ele chama: aprendiz de pica-pau –, atividade que desenvolvia sem remuneração, trabalhando oito horas por dia. Em março de 1959, passou no teste e começou a atuar oficialmente como Telegrafista. Trabalhava na Estação Ipê da linha Santa Maria – Rio Pardo, onde conheceu Péricles, irmão de Maria José, que viria a ser sua esposa.
Péricles trabalhava na estação vizinha e, no dia 05 de julho de 1954, convidou Seu Paulo para um almoço. Paulo não quis aceitar, pois sabia como era difícil a vida de ferroviário e que nem sempre eram bem-vindas essas visitas surpresas no almoço. Contudo, aceitou o convite do amigo. Foi só depois que descobrir não se tratar de tanta surpresa assim, afinal, Péricles tinha uma irmã mais velha que ainda estava solteira e que, para a felicidade de Seu Paulo, era uma linda e adorável moça.
Após conhecer Masé, como a chama carinhosamente, Seu Paulo ficou dois anos entre namoro e amizade, olhares que iam e vinham pela janela do trem. Cultivaram um lindo namoro de estação.
Foi então, em uma viagem até Santa Maria, que Seu Paulo convidou Masé para tomar um refrigerante no carro restaurante e a pediu em namoro. Foram tempos de longas conversas na sala da casa dos pais da moça. O namoro durou dois anos. Casaram-se em 26 de outubro de 1963 e, às vinte horas, pegaram o trem noturno, onde passaram a lua-de-mel em gabine alugada por Obereci, como presente de casório.
A lua-de-mel teve resultado e, depois de nove meses, em 25 de agosto de 1964 nasceram as filhas gêmeas Carmem e Marcia. Em 25 de novembro de 1965, nasceu a terceira filha, Claudionara, e em 21 de dezembro de 1966, a quarta filha, Maria Cristina.
E foi no mesmo dia em que o telégrafo foi substituído pelo telex, em 26 de janeiro de 1971, que Paulo teve seu primeiro filho homem, Nilton Cezar. Após o nascimento do filho, foi transferido para Cruz Alta, onde passou a ser Controlador de Trem na linha Marcelino Ramos – Passo Fundo. Mas tarde, em 1974, tornou-se Programador de Trem.
Seu Paulo ascendeu na carreira ferroviária em 1986, quando passou a ser Supervisor de Movimento de Trem, chefiando o coração da circulação de trens no tronco Rio Grande, para onde se mudou com a família depois de viver por dez anos em Cruz Alta. Finalmente, em março de 1990, encerrou sua carreira com 36 anos e 6 meses de serviço.
É possível perceber que os anos passados na Ferrovia por Seu Paulo se confundem com sua própria existência. Durante toda essa longa trajetória pela Ferrovia, Seu Paulo reuniu documentos que lhe pareciam de extrema importância. Pequenos pedaços de tempo, vestígios do que foi a sua vida. Foi então que nasceu seu pequeno Acervo Documental. Constituído de documentos acerca da Ferrovia, mas que contemplam também acontecimentos da sua vida, o acervo de Seu Paulo é o que ele considera seu patrimônio, considerado por ele o mais importante na vida. Suas memórias, como ele diz “É o que se leva dessa vida”.
Seu Paulo tem o hábito de escrever, rabiscar, sinalizar no verso das fotografias aspectos que lhe pungem à memória; por vezes, anotações muito divertidas, sobre um passado distante, como vemos a exemplo nessas fotografias. Seu Paulo desbrava uma linha de memória e a faz proliferar em movimento de exaltação, em seus excessos de significação. Encontramos, assim, um colecionador criterioso e detalhista, convicto de que tudo pode ser uma linda história e nada deve ser deixado no esmaecimento do tempo.
Por Ana Reckziegel